19 agosto, 2010

Alma Luna

Todas as noites Alma Luna se deita, estendida na cama, do lado esquerdo, acostumada com o vazio da metade do leito. A noite inteira. Não muda de posição na cama nem na vida. No fundo, no fundo, ainda acredita que tudo, por si só, um dia vai mudar. Nunca está satisfeita.

Por que Alma Luna inteira é a partida, nunca a chegada, a estadia, sempre a despedida. Alma sempre se sente fora do lugar, ainda não chegou lá. Alma da alma presa, perdida. Não importa onde seja, nunca vai chegar, por que, como diria o tal livro, longe é um lugar que não existe.

Deve ser perto então esse lugar. Tão perto que se sente, tão dentro, tão próximo, tão inerente. Alma da alma comprimida.

Alma Luna descansa, repousa sua cabeça no travesseiro e sente que sempre, sempre, falta alguma coisa que está fora do lugar. E o que está? Não compreende. Só sabe que o seu destino não lhe pertence por que lhe falta ao coração a paixão por aquilo que tanto lhe perturba a mente.

Pensa apenas que quer chegar a um lugar, tão claro e tão específico. Um enorme vão sem paredes, com grandes janelas abertas por onde o sol sempre possa entrar. A vida sem pressa e sem demanda. A calma de esperar apenas do próximo dia chegar, sentada na varanda. Na varanda um gordo gato preguiçoso. Por todos os lados tintas, telas, livros e folhas. Ninguém para mandar. Alma da alma desprendida.

A leveza da responsabilidade apenas por si mesma e a materialização do sentir-se só, realmente estando. Por que sentir-se só acompanhada é um desencanto. Mas Alma Luna sabe que esse lugar talvez seja aquele lugar tão longe e de tão longe não parece que suas pernas alcancem.

A incrível vontade de sumir. Para um lugar que ninguém a procure, que Alma Luna simplesmente seja uma lembrança, quase um sonho, de quem um dia já a conheceu. E que por sua vez ela mesma se desprenda, tão alta, tão amena, tão intensa, que seja só ela a sua última lembrança, para que não sinta mais o peso do mundo e durma no lugar que quiser da cama.

Alma, Alma, acorda e se levanta.

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